Márcia Resende
Neste texto gostaria de refletir com vocês a respeito de Normose, vocês já ouviram essa palavra?
Normose, como bem disse Roberto Crema, é a patologia da normalidade.
Normose é o resultado de um conjunto de crenças, opiniões, atitudes e comportamentos considerados normais, portanto em torno deles existe um consenso de normalidade, mas que apresentam consequências patológicas e/ou letais. (Pierre Weil)
A Normose é uma doença típica de momentos em que convivemos num contexto em que predomina a violência, a falta de escuta, a falta de cuidado, a falta de responsabilidade, onde predomina a corrupção, a desumanidade, mas que, mesmo assim, achamos normal. (Roberto Crema)
Mas isso é mesmo normal?
O contato com o mundo nos faz ceder às influências externas.
Aceitamos tudo o que é posto e discutimos, questionamos e reivindicamos apenas no calor das manifestações. Renunciamos à nossa singularidade, à nossa individualidade e à nossa criatividade em função do que é “normal” a ser seguido. Temos receio de ser diferentes e de questionar.
Poderíamos, neste momento, refletir sobre a Normose da guerra, do racismo, da corrupção na política, dos problemas climáticos do nosso planeta, mas o que mais tem nos normalizado nos últimos tempos?
Eu afirmo sem hesitar, a pandemia.
O que mais ouvimos atualmente é a expressão “diante do novo normal...”!
Que novo normal estamos criando?
Vivíamos as nossas vidas de forma pacata, mas produtiva.
Nós, adultos, pais, saíamos para nossos trabalhos, voltávamos para casa cansados, tínhamos histórias para compartilhar. Tínhamos o direito de ir e vir.
Nossos filhos tinham um ensino tradicional. Eles saíam para estudar, tinham o professor presente em sala de aula, desfrutavam da companhia dos colegas, tinham provas, dificuldades e desafios no aprendizado e nas tarefas.
Vocês já pararam para pensar em tudo isso?
Vocês já se sentaram e conversaram com seus filhos sobre o que está acontecendo?
Vocês sabem o que eles pensam, como se sentem diante desse “novo normal”?
Durante todos esses meses tive a oportunidade de estar ao lado de vários deles, adolescentes e jovens. Tive o privilégio de acompanhá-los nesse “novo normal”.
Fui coletando desabafos, algumas críticas, questionamentos e até propostas para possível solução para tantos problemas.
Eles falaram sobre seus medos, suas frustrações e esperanças depois de tantos meses longe de tudo que, para eles, era uma vida normal.
Estar com eles e ouvi-los, saber o que pensam e o que sentem sempre me surpreende. E agora não foi diferente por isso, resolvi trazer alguns trechos autorizados por eles.
Nessas pequenas falas podemos conhecer um pouco do sentimento e esperança contida no coração de cada um que se apresentou para essa tarefa.
MEU NOME É ANNA ROSA, tenho 13 anos.
Acho que para muitos adolescentes como para mim, está sendo bem difícil viver esse tempo, sem ver os amigos e sair. Tenho a esperança de que tudo acabe logo, volte ao normal, para a minha vida de antes o mais rápido possível.
MEU NOME É GABRIELA, GABI. Tenho 13 anos.
A pandemia tem sido um momento muito difícil para todos nós. Não podemos frequentar a escola, não podemos ver nossos amigos com a mesma frequência e temos que sair sempre de máscara. Esse ano me senti muito sozinha, e sinto muita saudade de como tudo era. Mas tenho esperança de que aos poucos, tudo vai voltar ao normal e daqui a pouco vamos voltar a fazer tudo que fazíamos antes. Sem máscara, porque isso não é normal!
MEU NOME É LUCA, tenho 15 anos.
Essa pandemia está servindo para que a gente dê mais valor à escola, eu sinto muita falta de ir para lá. Também estou muito mais ansioso em relação a tudo, ao futuro principalmente. Espero que tudo volte ao normal em 2021. Espero que tenhamos liberdade.
MEU NOME É RICARDO, tenho 14 anos.
A minha opinião a respeito de todo o contexto mundial de pandemia e diversas incertezas que estamos vivendo é que tudo que acontece tem um propósito. Acho que dessa vez o mundo pede um momento de pausa e reflexão. A pandemia só trouxe coisas ruins, pânico, transtornos, medo, mortes e muitas outras coisas. A pandemia me fez repensar várias coisas e principalmente, aprender a dar mais valor na vida e nas pessoas. E essa pandemia reforçou também, que todos somos iguais, não importa, estamos todos no mesmo barco e precisamos um dos outros. Minha esperança é que a vacina contra a Covid-19, saia logo, ela é a única capaz de acabar com essa crise mundial; para que a vida possa voltar ao normal, como sempre foi e todos nós reclamávamos. Acho que um dos principais ensinamentos que essa pandemia trouxe foi ser grato e dar valor a tudo, absolutamente tudo.
MEU NOME É MARIA JÚLIA, tenho 19 anos.
Neste tempo de pandemia foi nítida a falta de empatia das pessoas. Um tempo que é necessário tomar cuidado não só consigo mesmo, mas com o outro. Muitas pessoas só conseguem se preocupar com festas, viagens e outras coisas que representam risco de contágio, não querem perdem a vida de antes. Para as pessoas que se abateram, que ficaram mais em casa, saindo apenas para o necessário, está sendo um tempo cada vez mais difícil. Um trabalho individual não surtirá resultado.
MEU NOME É GABRIEL AFONSO, tenho 18 anos.
Tenho ficado mais em casa, saio apenas para o que é necessário. Como moro com meus avós, sei da minha responsabilidade para com eles. Como qualquer outro jovem, fico chateado de não poder sair com meus amigos, jogar meu futebol. Hoje o futebol só pelo Rocket League. Fico pensando até quando tudo isso vai durar. Vejo muitos dos meus amigos lamentando a situação financeira de seus pais, alguns tiveram que fechar seus negócios. Eu espero que possamos voltar para a escola e que nossos pais possam voltar a trabalhar. Precisamos acreditar que tudo vai passar.
MEU NOME É FLÁVIA, tenho 15 anos.
A pandemia, para mim, tem sido um tempo de muito aprendizado. No começo eu fiquei com muito medo, a distância dos meus amigos, não poder ir à escola. Mas decidi que mesmo longe não iria perder o contato com eles. Tenho esperança de que aos poucos tudo vai voltar a ser como era antes. Não quero ficar presa a máscaras e impedida de dar um abraço.
MEU NOME É JOÃO GABRIEL, tenho 13 anos.
Na minha opinião a pandemia nos fez refletir sobre o que somos capazes e incapazes. As pessoas ficaram em casa presas, não podiam visitar amigos e parentes, pessoas de risco. O melhor, por enquanto, é seguirmos as orientações, ficarmos em casa até tudo isso passar.
MEU NOME É ARTHUR, tenho 13 anos.
Vejo essa pandemia como um jogo. Não conhecemos o adversário 100%, ele muda de tática a cada ataque. Dessa forma nossa defesa é quase impossível. Não podemos correr para o ataque, estamos confinados do lado de cá do nosso campo. Diferente do jogo onde temos que usar um uniforme, nesse somos obrigados a usar uma máscara. Que joguinho chato!
MEU NOME É ALANA, tenho 20 anos.
Eu vim estudar Engenharia Civil em Portugal. No início foi tudo novidade, mas não demorou muito e a pandemia chegou. Ficar longe da família foi bem complicado, principalmente nesse momento. Como todos ao meu redor achei que ia acabar rápido toda essa onda, mas o que aconteceu foi completamente ao contrário. Ficar isolada, muito tempo, longe das pessoas que sempre estiveram comigo tem sido uma aventura sem fim. Tenho muitas responsabilidades a serem cumpridas, muitas roupas para serem lavadas, dobradas e guardadas, louça para lavar... Acho que já deu para entender minha rotina. Durante a quarentena não fui à faculdade, não conseguia ver os amigos que fiz nesse período e tudo foi ficando mais complicado e triste. Mas como já dizia a filósofa Dory, de Procurando Nemo, “Continue a nadar, nadar, nadar! Para achar a solução...”. Eu continuo na expectativa pela chegada de uma vacina, para que todos possamos viver o nosso novo normal, para que eu possa sair com meus amigos, voltar à faculdade presencial e viajar bastante, incluindo obviamente o Brasil.
Todas as aflições que cada um de nós tem sentido neste período “anormal” está também nos corações de nossos jovens. É importante que sejamos todos solidários neste momento, aumentando a nossa compreensão e tolerância, pois todos estamos submetidos às mesmas angústias e desafios. Somente unidos e solidários teremos mais força.
Gostaria de concluir esse texto com um poema da Cecilia Meireles, para uma reflexão final.
Renova-te.
Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica-se os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
Para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro.
Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo.
Cecília Meireles
Que possamos ser sábios o bastante para orientar nossos filhos nesse mundo em constante transformação.
É possível!
Márcia Resende
Especialista em Teen, Life e Professional Coaching. Escritora de textos motivacionais, de liderança e comportamento para a página Coaching e Champanhe for Woman, de Portugal, para o Portal R2S e para a revista da Sociedade Latino Americana de Coaching.
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