Um marco na administração pública
Após a Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, somente em janeiro de 1947, no governo do marechal Eurico Gaspar Dutra, é que as primeiras eleições em sufrágio universal foram realizadas no Brasil.
Em Uberaba, o primeiro prefeito eleito pelo voto popular foi Boulanger Pucci e o primeiro vice-prefeito, Antônio Próspero. Apesar de ter sido uma eleição desvinculada entre prefeito e vice, coincidentemente na apuração, a diferença a favor do primeiro foi de apenas 3 votos (4.936/ 4.933).
Médico, formado em 1933 pela Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, Antônio Próspero, já temperado pelas lides sindicais da capital mineira, participou ativamente da política local. Foi, com Mário Palmério e Wadih Nassif, um dos fundadores do PTB e o seu primeiro secretário.
Nas eleições municipais de 1950, concorrendo pelo PTB, Antônio Próspero foi eleito prefeito com 4.186 votos. Seu companheiro de partido, Ovídio de Vito, concorrendo a vice-prefeito, perdeu a eleição para Paulo Derenusson, da UDN.
Naquele ano, o censo apurou cerca de 70.000 habitantes em Uberaba. Todavia, a soma dos votos apurados para todos os candidatos para o cargo de prefeito na eleição foi de 11.200 votos, demonstrando o desinteresse da maioria da população pela política.
A gestão de Antônio Próspero (1951/1954), apesar da escassez de recursos, ficou marcada na história de Uberaba, pelas conquistas, principalmente na área educacional e por fatos inusitados. Sem dúvidas, o acontecimento mais importante para a cidade foi a criação da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro em 1953.
Conta o historiador Guido Bilharinho em seu livro “Uberaba – Dois Séculos de História” que a decisão do governador Juscelino Kubitschek de criar a Faculdade e ceder o prédio da antiga penitenciária para o uso dela, decisão aprovada pela Assembleia Legislativa em 1953, aconteceu em decorrência da revolta da população de Uberaba em 1952.
Foi ainda na gestão de Próspero, relata Guido, que nasceu a Associação de Combate ao Câncer do Brasil Central, tendo sido eleito o médico Hélio Angotti presidente da entidade. É também o início da Faculdade de Direito do deputado Mário Palmério e ainda a fundação pela Companhia Nacional das Escolas da Comunidade, do Colégio José Ferreira.
Na área industrial, o fato mais importante para a economia local, e que teve a participação expressiva da ACIU, foi a instalação da fábrica de cimentos em Ponte Alta.
Entre os fatos inusitados, estão as oito mortes ocorridas por hepatite em 1951, provocadas por um enfermeiro de nome Bossuet, que não desinfetava as agulhas das seringas, contaminando seus clientes. Ele fugiu da cidade, mas o assunto, que tanto medo provocou na população, rendeu centenas de reportagens em jornais por um longo período.
Antônio Próspero, em 1951, teve a honra de receber Getúlio Vargas, presidente da República do Brasil, que, em visita à Uberaba e instalando seu ministério na Câmara Municipal de Uberaba, presidida por José Humberto Rodrigues da Cunha, fez um discurso em que teceu elogios ao prefeito.
A maior colaboradora de Antônio Próspero e o grande destaque de sua gestão foi sua esposa Quita Próspero, com quem se casou em 04 de julho de 1940, e posteriormente teve o filho Luiz, hoje aposentado.
Mulher de espírito arrojado e amante das artes, Quita era também dotada de uma invejável cultura. Destemida, aos 19 anos, escreveu um artigo bem fundamentado sobre o divórcio, uma ousadia, considerando os preceitos estabelecidos na religião católica. A atitude provocou resposta da Igreja nas palavras do Padre Francisco Curvelo, no jornal Correio Católico.
Segundo relata Jorge Alberto Nabut no Espaço Cultural da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, no Jornal da Manhã, Quita não se esmoreceu mantendo sua posição e demonstrando surpreendente erudição, através de uma tréplica publicada no jornal Quiriri, “Orgão do Centro de Cultura de Uberaba”, edição de 20 de maio de 1934. Seu tema sobre o divórcio, tão ardorosamente defendido naquele ano, só foi aceito e legalizado em 1980, 46 anos depois.
Quita foi colaboradora de jornais e revistas de todo o país, inclusive a famosa revista da época, “O Cruzeiro”. Sua paixão pela cultura impulsionou a criação de grupos teatrais provocando o reconhecimento público do talento dos artistas de Uberaba.
Conta o teatrólogo Reynaldo Domingos Ferreira em seu trabalho sobre as “Mulheres Importantes para a Cultura de Uberaba” que sob os auspícios de Quita Próspero foi criado o Teatro dos Estudantes, “Grupo Quita Próspero”, sob sua direção e que foi realizada a primeira e única “Semana do Teatro” em Uberaba, que, além da encenação de vários autores brasileiros, até mesmo um do Triângulo Mineiro, contou com o embaixador Paschoal Carlos Magno, criador do Teatro do Estudante do Rio Janeiro. Diz ainda Reynaldo que a primeira-dama se entusiasmava tanto com o desempenho dos atores do Teatro do Estudante que acompanhou por duas vezes o grupo em apresentações em Sacramento.
Guido Bilharinho lembra o apoio de Pedro Santana, presidente da União dos Estudantes, e revela que a primeira peça encenada foi “A Incrível Genoveva” de Frankilin Botelho de Patrocínio, no Cine Teatro São Luís em janeiro de 1954.
Quita se destacou também na área educacional, contribuindo para marcar a gestão de Antônio Próspero. Graças à sua influência e iniciativas é que se regulamentou o ensino rural, o que permitiu a efetivação e a nomeação de professores para lecionar.
Na área esportiva, Quita foi madrinha dos jogadores de vôlei nos Jogos Abertos do Interior e nos jogos da Alta Mogiana, nas palavras de Lidia Varanda contadas para Jorge Nabut em sua coluna no JM, revelando ainda que considerava Quita uma mulher fantástica.
Em janeiro de 1957, conforma livro de Guido, o cronista social Herculano Rodrigues Naves, apresenta no “Jornal de Uberaba”, a lista das dez mulheres mais elegantes de 1956 – Maria Alice Terra, esposa de Carlos Smith, Diná Cunha da Cruz, Naná Rodrigues da Cunha, esposa de Hugo Rodrigues da Cunha, Celuta Leite, de Adalberto Rodrigues da Cunha, Anete França, de Murilo Jardim, Maria do Rosário Borges, de Mauro Andrade Oliveira, Stela Terra, de Romes Cecílio, Quita Costa, de Antônio Próspero, Célia Rodrigues da Cunha, de Artur Machado Junior e Adélia Machado, de João Caetano Borges.
Ainda de acordo com Bilharinho, Quita Costa Próspero fundou em 15 de setembro de 1948, a Sociedade de Assistência aos Lázaros da qual foi diretora, em companhia de Mária da Glória Leão Borges, Raula de Chirré Jardim, Terezinha Maciotti, Eunice Soares Mendes e Laura Sabino de Oliveira.
Seu maior destaque na área administrativa e de repercussão nacional foi a criação da merenda escolar na rede municipal de ensino, fazendo com que Uberaba fosse a primeira cidade brasileira a estabelecer esta medida que foi seguida por todos os municípios brasileiros.
Nas eleições para Assembleia Legislativa ocorridas no período de 1955 a 1959, Antônio Próspero ficou na suplência, mas conseguiu exercer o mandato por um longo período.
Por razões políticas, Próspero se afastou do PTB. Tentou mais uma eleição disputando novamente o cargo para prefeito pelo PSB, em 1958, concorrendo com Jorge Furtado (PTB) e Jose Bilharinho (PSD).
O vitorioso, Jorge Furtado, obteve 7.970 votos contra 7.605 votos apurados em favor de Próspero. Bilharinho recebeu 6.209 votos.
Dessa data em diante, Próspero encerrou sua carreira política, dedicando-se exclusivamente à sua clínica médica. Nascido em 27 de março de 1910 em Uberaba, Antônio Próspero faleceu em 27 de dezembro de 1979, aos 69 anos.
Seu nome foi eternizado no “Estádio Antônio Próspero”, associação esportiva que está localizado na rua Iguatama, Vila São José, e na rua “Antônio Próspero”, localizada no Bairro Vila Militar.
Quita Próspero, nascida em Uberaba na data de 28 de fevereiro de 1914, ficou viúva aos 66 anos de idade. Enviuvada, dedicou-se de corpo e alma à filantropia. Participou ativamente como Conselheira de diversas entidades. Faleceu em 10 de julho de 1996, aos 82 anos.
A Câmara Municipal de Uberaba, através da Lei 7885 de 22 de março de 2001, aprovou o Projeto 115/01 de autoria do vereador Hilton Delduque, que autoriza denominar “Quita Próspero”, logradouro público em Uberaba.
Fontes: Luiz Próspero, Guido Bilharinho, Reynaldo Domingos Ferreira, Jorge Alberto Nabut e Superintendência do Arquivo Público de Uberaba.
Gilberto Rezende
Empresário, membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, ex-presidente da ACIU e do CIGRA.