Por Vera Lucia Dias
Mestre em Psicologia clínica pela PUC/SP; Terapeuta do Luto; Terapeuta Comunitária e EMDR (tratamento de Traumas), palestrante e escritora


O homem sempre observou e categorizou o comportamento humano e essa categorização foi modificando seus paradigmas fazendo surgir, ao longo dos séculos, diversas classificações que culminaram em Manuais Diagnósticos e Estatísticos de Transtornos Mentais, hoje em sua quinta versão (DSM-V) e Classificações Internacionais de Doença (CID-11 atualmente), ambos chancelados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e Associação Psiquiátrica Americana (APA).   

Tais “documentos” embasam o diagnóstico, tratamento e a prática clínica dos profissionais de saúde e são sempre atualizados com base em pesquisas e evidências que visam proporcionar uma adequada atenção aos indivíduos que convivem com transtornos mentais. 

Dentre estes transtornos, a ansiedade tem sido tão frequente que deu ao mundo pós-moderno o rótulo de “idade da ansiedade”, considerando a dificuldade das pessoas em conviver “de boa” com o ritmo frenético da vida atual, cobranças, pressões, competições, necessidade de acumular bens materiais, com a discrepância entre o que se é e o que se quer ser ou o que se quer ter, sempre buscando mais para sentir-se pertencente à uma realidade perfeita propagada nas redes sociais e que, na maioria das vezes, é fictícia. 

Como fenômeno afetivo natural, a ansiedade possui o lado bom de permitir que as pessoas fiquem atentas a perigos reais e tomem medidas para sobreviver a ameaças ou se adaptar a circunstâncias desconhecidas. Por outro lado, se ela se torna um sentimento de medo constante desagradável e vago, uma apreensão e desconforto diante de perigo eminente ou algo desconhecido e estranho, uma sensação de sufoco e opressão que provoca sintomas somáticos desconfortáveis, pode ser considerada patológica se resultar em sofrimento ou prejuízo funcional importante. 

A grosso modo e visando apenas uma visão geral do transtorno de ansiedade podemos dizer que, clinicamente, “as ansiedades não são todas iguais”. Elas podem ser categorizadas em Transtorno de Ansiedade Generalizada ou TAG na qual o paciente pode apresentar tensão muscular, hiperatividade autonômica, nervosismo, dificuldade de concentração, irritabilidade, distúrbios de sono, sudorese, náuseas, diarreia, cefaleia e respostas exageradas de sobressalto a estímulos geralmente inócuos, como o barulho. 

A síndrome ansiosa ou de ansiedade é composta por sintomas que podem ser subjetivos e objetivos. Os primeiros, vividos como uma experiência psicológica, incluem temor, preocupações exacerbadas com as situações do dia-a-dia despersonalização etc. Os objetivos, ou somáticos se prolongam e se repetem de forma moderada ou severa e se apresentam sob a forma de dores abdominais, náuseas, vertigens, palpitações e boca seca, por exemplo, podendo levar a um comprometimento social e sofrimento psíquico visíveis. 

O Transtorno de Pânico, por sua vez, caracteriza-se por ataques inesperados, com frequência e duração variáveis não relacionados a estímulos ou situações específicas, mas, com intenso temor ou apreensão e acompanhados de palpitações, sudorese, tremores, falta de ar, tontura, calafrios, ondas de calor e medo intenso da morte e frequentemente os pacientes se preocupam com a sua ocorrência e utilizam de estratégias para evitar que eles aconteçam. 

A Agorafobia ocorre em situações nas quais o indivíduo acredita ser difícil escapar ou receber ajuda, caso necessário, ao usar um transporte público, estar em meio à multidão e com medo de consequências negativas ou constrangedoras, passa a evitá-las, ou as enfrentam com intenso medo, ou muitas vezes utilizando automedicação, ou abusam de álcool e sedativos. 

Além dos tipos ainda mencionados, podemos citar ainda a Fobia Específica que é um excessivo e marcante temor desproporcional ao perigo real ou ansiedade que ocorre de objetos ou situações específicas (certos animais, viagens aéreas, alturas, espaços fechados, sangue ou ferimentos) e que pode se transformar num ataque de pânico; o Transtorno de Ansiedade Social que ocorre em situações de interação social ou desempenho diante de outros pelo  temor do constrangimento ou da avalição negativa dos outros e pode ter sua origem após uma experiência estressante ou humilhante; o Transtorno de Ansiedade de Separação relacionado à separação de figuras de apego. No caso de crianças e adolescentes direcionada a cuidadores, pais ou outros membros da família e nos adultos, normalmente para parceiros ou filhos, demonstrando preocupação com o bem-estar ou a morte das figuras de apego e a necessidade de sempre estarem em contato com elas. Frequentemente ficam relutantes a saírem ou viajarem desacompanhados e no caso de crianças, a permanecerem sozinhos em um local. 

Finalizando, ainda temos o Mutismo Seletivo que acomete crianças que não conseguem falar em situações sociais nas quais há expectativa ou demanda para que falem. Em casa e com a família, falam sem problema, mas tem dificuldade em fazê-lo com outras pessoas, inclusive na escola, em prejuízo do deu desempenho acadêmico. Às vezes o problema só é perceptível na ida para a escola já que antes a criança se engajava em atividades em que a fala não era exigida. 

A diferenciação entre tantas nuances diferentes de ansiedade só pode ser realizada por profissionais que fazem o diagnóstico segundo critérios indicados nos documentos que citamos no início do artigo e que analisam quais sintomas estão presentes na maior parte do tempo (frequência), seu histórico e início (duração) e suas características (intensidade) para, a  partir daí, definirem as intervenções necessárias. 

Lendo esse artigo pode ser que você se reconheça com alguns dos sintomas descritos já que uma vez ou outra, todos nós experimentamos a ansiedade, mas não caia na tentação de se automedicar, tomar um remédio que foi bom para outra pessoa ou de permanecer fazendo uso de algum que você já usa há muitos anos sem notar melhora. Numa alusão ao nosso artigo da edição anterior da Revista Mulheres intitulado “SE PRECISAR, PEÇA AJUDA”, o alerta vale também para o caso do transtorno de ansiedade. Procurando um bom profissional ele fará um diagnóstico seguro e preciso de acordo com suas condições atuais, ajustará doses ou trocará medicamentos, indicará psicoterapia se considerar necessário, mudanças no seu estilo de vida ou recomendará práticas como yoga, relaxamento e outras tantas disponíveis que podem contribuir para  seu autoconhecimento e melhor regulação do seu  estado emocional e mental.