Profissionais relatam desafios ao enfrentar a covid-19

Jornalista Isabel Minaré


Todos os dias, a servente de limpeza Rosélia Martins, 54 anos, chega cedo ao Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (HC-UFTM) para se paramentar. O trabalho dela é essencial para garantir que o novo coronavírus não se prolifere no ambiente.

Rosélia já realizava um serviço minucioso de limpeza e desinfecção, mas, devido à pandemia do Sars-Cov-2, precisou redobrar os cuidados. No começo, ela sentiu muito medo. “Era algo desconhecido e não sabia o que teria que enfrentar”, confessa. Outra dúvida dela era saber se os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) realmente seriam eficientes para impedir o contato com o vírus. Aos poucos, compreendeu que com a paramentação e a higienização corretas não se contaminaria e nem ofereceria riscos para outras pessoas.

Rosélia é uma profissional, entre tantas, que se empenha na linha de frente do combate à covid-19. Milhares de trabalhadores se dedicam exaustivamente a salvar a vida de quem está contaminado. No meio desse cenário atípico, eles enfrentam diversos desafios, como mostra esta reportagem da Revista Mulheres.


Rosélia redobrou os cuidados com a limpeza e desinfecção no hospital.
Foto - Ighor Thomas


Domingo. Quase hora do almoço. Um paciente suspeito de covid logo seria internado. A equipe estava numa correria danada. Depois da preparação, a técnica de enfermagem Fernanda Gomes, 29, da UTI Neonatal e Pediátrica do HC-UFTM, entendeu que aquilo que via o tempo todo na televisão, sobre gravidade e letalidade da doença infectocontagiosa, estava bem próximo dela. Ela presenciou uma amiga de setor se debulhar em lágrimas de tanto medo.  Fernanda se sentiu aflita, engoliu o choro e, mesmo fragilizada, conseguiu acalmar a companheira. Chegou em casa e refletiu sobre a profissão que havia escolhido. Não possuía comorbidades e nem idade avançada. Pediu a Deus saúde, paciência, persistência e força.

Fernanda e o resto do mundo precisaram mudar os hábitos e se adaptar ao que se tornaria o “novo normal”. Para a técnica de enfermagem, lidar com as questões psicológicas é a parte mais difícil. “O pior momento é saber da existência de colegas infectados. Passa um filme na cabeça. Eu estava usando máscara quando ficava perto deles? Tive quebra de barreira? Senti alguma coisa nesses últimos dias? Alguém da minha família teve sintoma? Quando vou ser testada?”, questiona. Ela enfatiza o aprendizado: ninguém sabe de e está preparado para tudo.


Lidar com as questões psicológicas é a parte mais difícil para Fernanda. Foto - Ighor Thomas


Além do medo, da insegurança e das incertezas, outro problema enfrentado pela equipe de batalha é justamente a falta de recursos humanos. A fisioterapeuta Kelly Sucupira, 36, trabalhava seis horas por dia, cinco vezes por semana, antes da covid. Agora, essa carga horária tem dobrado com frequência, o que faz com que ela trabalhe por mais tempo e realize o serviço de mais gente. “Estamos com um déficit de profissionais afastados por estarem no grupo de risco ou por possuírem atestados”, explica.


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Kelly também atenta para a agonia ao falar sobre o controle da utilização de equipamentos necessários para a recuperação dos pacientes.  “Cada telefonema da regulação de leitos querendo saber quantos ventiladores mecânicos estão em uso e quantos outros ainda temos disponíveis é desesperador. Saber que vidas estão sendo contadas realmente é viver em uma realidade jamais imaginada”, confessa.

A perda de pacientes e de colegas de trabalho é um dos momentos de maior sofrimento. Para evitar o risco de contaminação, somente uma pessoa pode entrar no necrotério e fazer o reconhecimento do corpo – atualmente através de um vidro. “Uma sala vazia com uma única cadeira. Ali você vai se despedir do seu ente querido, sem poder tocá-lo, sem poder se aproximar dele. É uma profunda solidão”, explana a fisioterapeuta.  


Kelly aponta a falta de recursos humanos como um dos desafios enfrentados durante a pandemia. Foto - Ighor Thomas


A enfermeira Maria Sueli Silva, 49, do setor de acolhimento familiar do HC, presta assistência aos pacientes e parentes deles. Uma das responsabilidades dela é informar como evitar o contágio. Mesmo sabendo exatamente como se prevenir, ela testou positivo para o coronavírus. “Uma colega do setor pegou (a covid). Estava assintomática, mas resolvi fazer o teste, acreditando que não teria nada. Não deu outra: estava contaminada”, detalha. Maria Sueli chorou muito e teve Síndrome do Pânico. Passava horas a se perguntar onde errou. Depois disso, ela consegue conversar com mais propriedade sobre o assunto com os pacientes. A empatia aumentou, pois sabe bem o que passa uma pessoa com a doença.


Maria Sueli foi uma das profissionais de saúde que testou positivo para a covid-19.
Foto - Ighor Thomas


A pandemia também traz ensinamentos. “Aprendi como é essencial aproveitar todos os momentos da nossa vida e a dar valor a um abraço, pois dele sinto falta”, admite a fisioterapeuta Luana Barbosa, 37, do HC e de uma cooperativa de saúde, ao falar sobre as vezes em que chegava do trabalho e tinha que desviar do filho, que insistia em dar e receber carinho. O segredo dela para ter motivação em um contexto delicado é trabalhar com muito amor. “Gosto de voltar para a casa em paz e com a sensação de dever cumprido”, conclui.


Depois da pandemia, Luana passou a dar mais valor ao abraço. Foto - Ighor Thomas


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