Jornalista Isabel Minaré


Inundado, arrasado, destruído. Assim ficou o Rio Grande do Sul após as múltiplas enchentes neste ano. Das quase 500 cidades gaúchas, mais de 470 foram atingidas pelo maior desastre do estado. Impactos sociais e econômicos inimagináveis foram vistos. Vidas foram ceifadas. Milhares de pessoas ficaram desabrigadas. Uma dor que não cessa. Uma água, que mesmo sem temporal, ainda transborda, nem que seja ‘num rio de lágrimas’. Uberaba ouviu os milhares de gritos de socorro e se dedicou em colaborar. Doações chegaram aonde precisavam e mudaram o rumo de muita gente.

Thiago Pereira, conhecido por Thiago Sorrisão, é de missões humanitárias, brigadista, bombeiro civil e filantropo. Experiente em voluntariado em tragédia (já esteve em Mariana e Brumadinho, ambas em Minas Gerais), ele é a prova de que existem seres obstinados em tornar o mundo um lugar melhor para todos. Quando recebeu o chamado para contribuir, largou tudo e foi para o RS. Tinha a data de ir, mas não tinha noção de quando poderia voltar. Um ato de coragem, comprometimento e resiliência. “Não é uma decisão, é uma obrigação de ajudar os irmãos que necessitam”, confessa. “Até quem iria ajudar, como bombeiros, Defesa Civil e brigada militar, sofreu e precisou de apoio”, afirma.


Sorrisão (de preto) pratica atividades lúdicas com os desabrigados.


Thiago atuou com buscas, salvamentos, resgates de vidas (humanas e de animais) em Muçum, Roca Sales, Novo Hamburgo, Pelotas, Canoas, Porto Alegre, Osório e Nova Santa Rita durante mais de 40 dias. Frequentemente, ‘sentia estar entre o céu e o inferno’. “Saíamos à noite nas embarcações, só com as luzes de lanternas, e ouvíamos inúmeros pedidos de socorro vindos das casas”, relata. “Tinha dia que resgatávamos de 200 a 250 pessoas e as levávamos para uma área mais alta e segura”, completa. Ele chegou a se sentir impotente. “Era muita gente pra ser socorrida, em cima dos telhados, e um contingente insuficiente para ajudar”, explica.

Thiago viajou três vezes para o estado. Na primeira vez, encontrou o caos, com a população sem acesso à internet, água potável, alimentação adequada, energia elétrica, entre outras necessidades. Na segunda, a situação era de crise, entretanto um pouco melhor do que a anterior, com a chegada de novos voluntários preparados para lidar com a situação. A comunidade já se alimentava e se comunicava, por exemplo. Na última, as enchentes já tinham acabado. Então, foi a hora de visitar os locais específicos para os desabrigados e se empenhar em atividades lúdicas. “Brincávamos e tentávamos distrair o pessoal”, ressalta. Respiros, gargalhadas, abraços e muita vida pela frente!

Entre uma viagem e outra, Thiago reuniu o povo de Uberaba num grande movimento altruísta. Ele uniu Prefeitura de Uberaba, Câmara Municipal, Tiro de Guerra, UFTM (Universidade Federal do Triângulo Mineiro), IFTM (Instituto Federal do Triângulo Mineiro), Correios, Companhia Aérea Azul e ONGs para a arrecadação e o envio correto dos mantimentos. “Foi um choque positivo, pois, pra mim, foi o maior movimento de arrecadação para ajudar um estado”, revela.


A presidente do Zebu do Bem, Iara Marquez, e amigos se mobilizaram numa corrente solidária. Foto - André Santos


O grupo Zebu do Bem, da ABCZ (Associação Brasileira de Criadores do Zebu), também foi comovido pelos afetados pela calamidade. Através de um esforço intenso e a conexão com entidades e parceiros, ele fez uma verdadeira onda de solidariedade. Mais do que produtos, conforto, união e empatia foram enviados aos gaúchos. A presidente do Zebu do Bem, Iara Marquez, se emocionou ao ver as vítimas da catástrofe e se mobilizou para criar uma corrente do bem. “Fiquei apavorada quando vi a situação e logo decidimos fazer uma campanha”, enfatiza. Com a divulgação entre amigos e na imprensa, a ação ganhou peso e mostrou a capacidade impressionante de mobilização do povo de Uberaba. “Mandamos um caminhão com 33 toneladas de água potável, alimentos não perecíveis, itens de higiene pessoal, materiais de limpeza e roupas”, assegura. Mais cinco caminhões, com cargas compartilhadas, chegaram cheios de donativos às regiões devastadas. Tudo foi doado para Porto Alegre.


Equipe do Tiro de Guerra ajudou a carregar o caminhão. Foto - divulgação Iara Marquez


Em comunicado enviado no dia 1º de setembro, cerca de quatro meses após a tragédia, a Defesa Civil informou que, além dos 183 mortos, o Rio Grande do Sul ainda registra 27 pessoas desaparecidas após a enchente. Mais de 2,4 mil seguem fora de casa. 3,5 mil animais perderam seus lares. Ou seja, o tempo passou, porém a dor, a angústia e o desespero continuam. As necessidades de apoio, doações e muito amor permanecem.



Defesa Civil Nacional em conjunto com os Missões Humanitárias. Foto - divulgação Thiago Sorrisão