Gilberto Rezende
É muito doloroso para qualquer cidadão ver os destroços em que se transformou a usina da “Copervale”, antiga Cooperativa de Leite, localizada às margens da BR 262. Quem a conheceu em seus áureos tempos, produzindo não só o leite pasteurizado, mas também queijos e manteiga, rações, doces e outros produtos com a marca Centenária, com grande aceitação de mercado e com sua clientela esparramada pelo território nacional, não se conforma com a situação a que foi relegada.
Fundada em 1947, com Carlos Tasso Rodrigues da Cunha na presidência, e com início de atividades em 1948, com nova diretoria comandada por Edmundo Inácio de Oliveira, a Cooperativa dos Produtores de Leite de Uberaba iniciou suas atividades ao adquirir de Pedro Salomão, o imóvel e maquinário do “Laticínio Triângulo”, que fora inaugurado em 1941, localizado na praça Manoel Terra, frente ao Mercado Municipal.
Antiga Cooperativa de Leite
Nasceu assim a Cooperativa de Leite de um pequeno grupo formado inicialmente com 28 associados, totalizando 113 no final desse mesmo ano de 1947. Todavia, ao longo de sua existência, se transformou num império, construído com muitos sacrifícios de seus administradores e dos fornecedores de leite.
Em 1949, sob a administração de Otaviano Moreira, fomos testemunha e participante desse esforço: entregávamos o leite para as carroças na madrugada e as contabilizava no seu retorno no período da tarde.
Em 1964, 25 anos após sua fundação, a Cooperativa recebia diariamente uma média de 30.000 litros de leite dos quais industrializava 6 mil litros e fabricava 1 tonelada de queijo e manteiga. Em 1973 o número de cooperados subiu dos 113 iniciais para 1.228, chegando a 2082 em 1983.
om a participação de fornecedores de outras regiões, em 1974 a Cooperativa dos Produtores de Leites de Uberaba mudou sua razão social para “Copervale - Cooperativa Regional dos Produtores de Leite do Vale do Rio Grande Ltda.”
Em 1982 a Copervale inaugurou sua nova usina localizada às margens da BR 262. KM 803, em uma área de 80.500 m2, adquirida do Matadouro Industrial e Comercial de Uberaba em 1975, gestão de Ovídio Miranda Borges. Foram edificados 6.500 m2 com capacidade frigorifica de 200.000 litros de leite por dia.
Copervale - Tanques de armazenamento de leite
Um ano após sua transferência, em 1983 já se contabilizava diariamente nas novas instalações, o recebimento de uma média de 143.000 litros de leite e a produção de 3 toneladas de queijo e 1 de manteiga.
Após 43 anos, o antigo prédio da praça Manoel Terra foi demolido e ali foi construído um supermercado, com o objetivo de atender às necessidades dos produtores de leite.
Todos os diretores que assumiram a responsabilidade pela criação e o desenvolvimento da Cooperativa, devem ser reconhecidos pela dedicação que abraçaram a causa do cooperativismo. Todavia não se pode deixar de ressaltar o trabalho de José Valim de Melo.
Eleito por 7 vezes presidente da Cooperativa dos Produtores de Leite de Uberaba, de 1950 a 1957, ocupou ainda o cargo de Conselheiro Fiscal em1961. Ao final do trabalho de cada dia, na maioria das vezes ia a pé para sua residência, localizada, no bairro que leva seu nome, “Valim de Melo”.
José Valim de Melo
Outra figura expressiva na história da Cooperativa de Leite é o do T. Cel. Fernando Ferreira Vieira da Silva, administrador nato, presidente escolhido pelos produtores associados em 18 eleições, em períodos alternados, transformando a velha Cooperativa em uma empresa moderna. Soube conduzir a Cooperativa com firmeza e dedicação. Foi em sua gestão que que ela se transformou em “Copervale” e que se marcou seu empenho na construção da nova Usina.
Tenente Coronel Fernando Ferreira Vieira da Silva. Foto: Cana Campo
Em 1992 mais um salto foi dado com o lançamento do leite Longa Vida, atingindo a Copervale o auge de sua produção industrial, registrando mais de 3.000 fornecedores. Passou a envasar este leite para outras empresas, como a Calu e a Parmalat e para sua empresa, com a marca Centenário.
Em 2007, começa seu calvário. Na gestão de Luiz Gualberto Ribeiro Ferreira, a Copervale foi denunciada por adicionar produtos químicos nocivos à saúde com o objetivo de amplia sua lucratividade. Em consequência teve, inicialmente, 700.000 litros de leite estocado em dois tanques, lacrados pela Policia Federal e administração entregue a interventor.
Com muitas dificuldades financeiras e abalada em sua credibilidade em decorrência da operação denominada “Ouro Branco”, a empresa, então com uma dívida de 55 milhões de reais, solicita Recuperação Judicial em janeiro de 2014.
Nesse mesmo ano de 2014 a Copervale, que já havia registrado em sua folha de pagamentos 250 funcionários, encerrou suas atividades, colocando fim em um ciclo de 67 anos de muito trabalho para todos os idealistas que fizeram de uma pequena cooperativa uma grande empresa.
Com a paralização da usina, os imóveis da Copervale passaram a sofrer ações de vandalismo, furtos de equipamentos e incêndios, depreciando consideravelmente seu patrimônio.
Em 2017 um Fundo de Investimento adquiriu 100% das ações da Copervale, segundo declarações do novo Presidente do Conselho, Miguel Larios, com o intuito de restabelecer a produção da usina de leite.
Todavia, em fevereiro de 2018, em assembleia, ex-funcionários e credores da Copervale negaram pedido do representante do Fundo para adiamento de decisões que pudessem prejudicar a empresa. Não teve respaldo. A maioria votou pela falência que foi decretada pelo Juiz no mesmo ano.
Decorrido já três anos, as vendas efetivadas de parte do patrimônio atingiram valores bem abaixo do previsto. Faltam ainda imóveis para serem alienados quando então se dará o início ao pagamento dos ex-funcionários.
Um ponto final em que, como acontece na maioria absoluta das falências, todos acabam perdendo - empregados, fornecedores de leite, credores e principalmente a cidade que assiste desolada, a ascensão e queda de um império.
Fontes – A Copervale de autoria de Maria Antonieta Borges Lopes, editado em 1985. Jornal da Manhã. Élvia Moares – Rádio Sete Colinas. Foto de José Valim de Melo do acervo de Álvaro de Melo Rezende, gentilmente cedida por Kátia Castejon Rezende Ferreira.
Gilberto Rezende
Empresário, membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, ex-presidente da ACIU e do CIGRA.